Em geral adotamos novas tecnologias porque elas resolvem problemas, prometem modos de passar melhor os dias e alcançar objetivos. Mas é imediata a percepção de que elas podem trazer em si novos riscos às pessoas. Nossa sociedade – que sempre fez uso de tecnologias e que nos últimos cinquenta anos acelerou e aprofundou essa tendência – aprendeu há muito a munir-se de mecanismos de controle dos riscos que elas podem trazer para nossas vidas e saúde.
Os leitores se lembrarão – ou já terão lido a respeito – de um trágico episódio mundial ocorrido nos anos 1960. Exatamente em maio de 1961 o Dr. McBride, que medicava na Austrália, relatou à comunidade médica quatro estranhas ocorrências de defeitos congênitos graves em crianças. Observou também que as mães haviam feito uso durante a gravidez de um ansiolítico, a talidomida, para conter vômito durante a gravidez. A tecnologia, o medicamento, foi retirado do mercado tão logo o produtor foi comunicado das ocorrências. Milhares de bebês nascidos de mães que haviam feito uso desse medicamento foram o sinal de que ele podia gerar tal efeito. A teratogenicidade do medicamento não havia sido testada antes que fosse aprovado para comercialização.
Apenas a agência norteamericana fazia exigência de estudos de segurança do medicamento – reações adversas e outros riscos à saúde – para comercialização no seu território. A providência passou a ser então adotada em um número cada vez maior de países. Atualmente é uma exigência para a aprovação de qualquer medicamento.
Além da segurança, como explicitado acima, os medicamentos devem demonstrar eficácia, que em termos grosseiros significa dizer que eles devem servir para tratar o agravo para o qual estão destinados.
Ambas as exigências precisam ser demonstradas, desde aquele episódio da talidomida, nos chamados ensaios clínicos. Estes são estudos de caráter epidemiológico, ou seja, aplicados à população, cujas metodologias devem permitir verificar se os riscos envolvidos são aceitáveis e se a eficácia é a desejável.
Dos medicamentos já usados há um longo tempo, geralmente se conhece a segurança. Por exemplo, sabe-se qual dose é aceitável (mínima e máxima). A perspicácia popular entende com muita clareza que qualquer substância pode ser nociva à saúde, se consumida em quantidades inapropriadas.
A eficácia de um medicamento novo, ou de um medicamento antigo com indicação para uma nova finalidade, exige mais tempo para ser verificada. Entre outras razões, é preciso demonstrar que a possibilidade do sucesso ao usar o medicamento, observado em uma certa quantidade de casos, não se deu por coincidência: por exemplo, a coincidência de que o sucesso observado naqueles pacientes a quem foi administrado o medicamento tenha sido decorrente de um outro fator – não o medicamento testado -, que todos os pacientes apresentavam, que era um fator de proteção, e que não foi observado e controlado nos casos tratados.
Nossa sociedade desenvolveu importantes ferramentas nos tempos recentes para controlar riscos e demonstrar eficácia das tecnologias, inclusive as medicamentosas. É algo que temos para nos orgulhar.
Sendo a vida humana o valor fundamental a ser desenvolvido e preservado, compreende-se de forma cristalina porque temos urgência de métodos capazes de acelerar a demonstração de segurança e eficácia. Também será necessário que todos nos envolvamos na discussão ética para contenção dos riscos provenientes do próprio ritmo acelerado em que nossa sociedade produz novas tecnologias.
A ciência avança rápido, isso não significa que tenha que ser apressada!
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